Abaixo-Assinado (#42987):

Carta pública de apoio à Capoeira no CEPEUSP

Destinatário: Diretoria do Centro de Práticas Esportivas da Universidade de São Paulo (CEPEUSP)

Carta pública de Apoio

São Paulo, 28 de Setembro de 2018

À Diretoria do Centro de Práticas Esportivas da USP - CEPEUSP.

Nós, integrantes das comunidades interna e externa da Universidade de São Paulo - USP, junto com a comunidade da Capoeira, vimos por meio deste abaixo-assinado manifestar nosso apoio e anseio pela manutenção do trabalho de Capoeira que vem sendo desenvolvido pelo professor Womualy Gonzaga dos Santos dentro do CEPEUSP.

Defendemos a continuidade e a permanência desse trabalho de apoio à salvaguarda da Capoeira, reconhecida pela UNESCO como patrimônio histórico, artístico e cultural mundial, e destacamos, concomitantemente, a elevada importância tanto das ações de extensão às quais o mesmo professor se dedica a realizar no cotidiano das universidades públicas, ainda tão excludentes e reprodutoras de uma cultura ocidental branca, quanto dos encontros mensais que hoje ocorrem na praça do Relógio da USP, que reúnem capoeiristas e simpatizantes da Capoeira vindos de diversas partes da cidade e do Estado de São Paulo.

Além disso, a referida manifestação afro-brasileira remete, apesar das tentativas de apagamento, à visão não ocidentalizada de pessoa e mundo, o que, entre outras coisas, indica um entendimento do sujeito não pela sua individualidade, mas como parte de um todo integrado. Nesse sentido, a formação e manutenção de um grupo se dá por ação permanente – como vem acontecendo – em cuidadosa e contínua expansão, firmando bases para o envolvimento e apoio mútuo de seus integrantes. Tal processo coletivo é lento, nega as bases do raciocínio produtivista e mercantil, e se faz fundamental para dar sentido à existência e prática da Capoeira.

Cabe destacar que o professor Womualy realiza intensivamente tal salvaguarda e a valorização dessa prática de forma contínua, através do exemplo nas suas buscas e respeito, além de seu ensino e das discussões presentes no cotidiano de suas aulas e no incentivo e fomento aos encontros e buscas pelos saberes ligados à Capoeira e às manifestações que a ela se relacionam, dentro e fora dos horários e locais regulares das suas aulas, nas formas presencial ou remota. Sua atuação constante em defesa das formas igualitárias e livres de aprendizado, lazer, encontro, discussão e compartilhamento promovem a conexão de pessoas das mais diversas realidades sócio-culturais em locais e eventos diversos, colocando a Universidade de São Paulo e o citado Centro como parte ativa na reprodução de uma discussão que já está atrasada para seu início sistemático.

Sabe-se que já houve diminuição da carga horária original do curso de capoeira, o que levou à redução de turmas por dificuldade de alguns alunos em conciliar horários de treino e suas atividades acadêmicas. O mesmo pode ser dito -e reforçado- a respeito das aulas oferecidas para terceira idade, que foi extinta da grade. Isso acarreta grandes perdas para as vidas desses alunos, para o trabalho de um profissional interessado em defender e promover os benefícios que traz essa manifestação, assim como em apoiar essas e outras pessoas em suas vidas, no que diz respeito à sua convivência, atuação no mundo, saúde física e mental, sua auto-estima, autoconhecimento e bem-estar. A presença das aulas de Capoeira promovem, também, uma descoberta de fatos, pessoas, imagens e cultura da nossa história com as quais quase não se entra em contato, e que, irônica e constantemente, têm sua importância sendo reiteradas e defendidas pela própria universidade em suas mais diversas áreas de estudo.

Lembrando que a missão do CEPEUSP é “oferecer à comunidade universitária programas de educação física, esporte, recreação e oportunidade de prática voluntária de atividades físicas, visando ao bem-estar, à melhoria da qualidade de vida e à sua integração, estendendo à comunidade externa na medida de suas possibilidades”, questiona-se o argumento de que a adesão – classificada como baixa – de matriculados(as) seja impedimento para o prosseguimento das atividades de capoeira nesse local. O oferecimento de tal curso atende aos objetivos de proporcionar saúde e lazer aos universitários e à comunidade externa, além de assegurar que uma manifestação cultural afro-brasileira seja resguardada. Entendemos que, tão importante quanto atingir determinada quantidade de público, as atividades devam configurar um leque diversificado para estruturar um serviço que de fato atenda às demandas da comunidade.

Dentre as ações de extensão realizadas pela iniciativa do professor Womualy, podemos citar os encontros da “Formação Continuada em Capoeira”, que já discutiram assuntos pertinentes ao momento sócio-político atual, tais como as relações de gênero e ações contra a violência imposta às mulheres dentro e fora da Capoeira; as relações étnico-raciais, a musicalidade, a Capoeira enquanto esporte, promotora de saúde e qualidade de vida, as prevenções de lesões e seus tratamentos; além da discussão sobre a Capoeira na escola, no ensino infantil e médio associados a questões acerca da educação e a inclusão da lei 10.639/03 retificada pela 11.645/08, que torna obrigatório o ensino da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena"em todos os níveis do ensino.

Entre outras ações que estão em andamento pelo professor e seus alunos está a organização e criação de um grupo de estudos para aprofundamento teórico e busca de relações entre a Capoeira e diversos campos do saber, abrindo, assim, espaço para produção acadêmica e interdisciplinar, em total diálogo com a proposta e função da universidade de produzir e difundir conhecimento. O curso de Capoeira foi citado em tese de doutorado defendida em 2016 na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e há interesse de pesquisadores da área que este curso seja mantido por ser um espaço de troca e aprendizado sobre a cultura brasileira em toda sua magnitude e extensão.

Julgamos imprescindível a permanência do curso de Capoeira do professor Womualy por ser mais um espaço de Capoeira na Universidade, que se coloca na sociedade, também, como alguns dos poucos pontos de convergência entre os saberes tradicionais dos mestres de Capoeira, congregando arte e cultura reconhecidas pelo IPHAN e pela UNESCO enquanto Patrimônio Imaterial da Humanidade.

Reforçamos este apelo, então, reiterando que a diminuição ou extinção do atendimento à comunidade por meio do curso de Capoeira do CEPEUSP, ministrada pelo citado professor, representa um retrocesso nas ações supracitadas, ferindo direito adquirido, firmado através de concurso público organizado e promovido pela devida instituição.

Havemos de fortalecer, também, que ações como estas defendidas aqui necessitam de tempo para se firmar de forma consistente e gerar os frutos de um trabalho. Trabalho este que engloba -e tem se mostrado primoroso nestes sentidos- e se alicerça, se forma essencial, nos sentimentos de pertencimento, confiança, empoderamento, comunidade, ressignificação, desconstrução e muita resiliência.

Por tais motivos, a comunidade em conjunto, vem manifestar sua imensa gratidão, assim como seu apoio e apelo em solicitar a esta instituição pública, a manutenção e o fortalecimento do curso de Capoeira oferecido pelo Centro de Práticas Esportivas da USP-CEPEUSP e conduzido pelo professor Womualy Gonzaga dos Santos.


Atenciosamente.

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